NOVA CARTOGRAFIA SOCIAL DOS CONFLITOS POR TERRITÓRIOS NO BRASIL CENTRAL

Capa de Livro: NOVA CARTOGRAFIA SOCIAL DOS CONFLITOS POR TERRITÓRIOS NO BRASIL CENTRAL

Esta publicação é produto da nova cartografia social dos efeitos das políticas governamentais e das agroestratégias elaboradas por conglomerados econômicos – da produção de commodities agrícolas, destinadas

principalmente ao mercado internacional - sobre os povos e comunidades tradicionais, em regiões designadas como “cerrado” e “caatinga”, “semiárido” ou “sertão”. Para efeito da investigação científica proposta pela nova cartografia social, tais regiões, assim designadas, compõem uma região mais abrangente aqui denominada “Brasil Central”, que engloba partes dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí, Bahia, Mato Grosso e Pernambuco, bem como o Norte de Minas Gerais e o Sul do Pará.

Por serem terras aráveis e apresentarem potencial para grandes plantios, tal região vem sendo pressionada pelo que se convencionou chamar de agroestratégias, que consistem um conjunto heterogêneo de discursos, de mecanismos jurídico-formais e ações ditas empreendedoras que, em tese, justificariam os atos de Estado (BOURDIEU, 2014) no violento processo de abertura dessas fronteiras ao grande capital estrangeiro e nacional.

Na perspectiva de problematizar essas agroestratégias, tento em vista a existência de modos de vidas tradicionais nessas regiões, o projeto “Conflitos Sociais e Desenvolvimento Sustentável no Brasil Central”, financiado pela Fundação Ford, articulou o “Grupo de Pesquisa do Brasil Central”, composto de associações de povos e comunidades tradicionais e de pesquisadores acadêmicos de 11 universidades, a saber: UEMA – Universidade Estadual do Maranhão, UFRB – Universidade Federal do Recôncavo Baiano, UNEB – Universidade Estadual da Bahia, UPE - Universidade de Pernambuco, UFPI – Universidade Federal do Piaui, UNEMAT – Universidade Estadual do Mato Grosso, UFOPA – Universidade Federal do Oeste do Pará, UNIFESPA – Universidade Federal do Sul do Pará, UEA – Universidade do Estado do Amazonas, UNIMONTES- Universidade Estadual de Montes Claros, UNITINS – Universidade Federal do Tocantins, e uma associação voluntária da sociedade cívil (APATO).

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As novas plantations: uma economia de riscos que ameaça povos e comunidades tradicionais

Alfredo Wagner Berno de Almeida

Os trabalhos de pesquisa ora apresentados fazem parte do Projeto “Conflitos Sociais e Desenvolvimento Sustentável no Brasil Central”, cujo objetivo consiste em mapear e analisar os efeitos das políticas

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governamentais e das agroestratégias, - elaboradas por conglomerados econômicos voltados tanto para a produção de commodities agrícolas, quanto para as mínero-metalúrgicas, destinadas principalmente ao mercado internacional - ; sobre os povos e comunidades tradicionais. A abrangência da área de alcance destas políticas focalizadas pelos trabalhos de pesquisa compreende regiões designadas como “cerrado” e “caatinga”, consoante os seguintes critérios: i) de bioma, relativo a “semiárido”, de acordo com critérios climáticos, e ii) de “sertão”,

conforme critérios geográficos e de planejamento regional. Tais designações compõem uma grande região definida para efeitos desta investigação científica como “Brasil Central”. Esta grande região abrange partes dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí, Bahia, Mato Grosso e Pernambuco, bem como o Norte de Minas Gerais e o Sul do Pará. Ela não corresponde à totalidade das áreas classificadas como de “cerrado”, nem tão pouco aquela concernente à “caatinga”, conforme se pode verificar na Figura 1, a seguir apresentada, e pode ser aproximada das savanas africanas, das “sabanas” tropicais de Venezuela, Colômbia, República da Guiana e sul do Suriname, onde são designadas de “Sipaliwini-savanna”. Todas estas regiões, por serem de terras aráveis e apresentarem potencial para grandes plantios, encontram-se, no momento atual, pressionadas por medidas concernentes às agroestratégias, que objetivam, numa escala global, a amplia expansão das terras destinadas aos agronegócios, disponibilizando novas extensões para monoculturas e para extração mineral através da intensificação de transações mercantis. Esta expansão se daria sobre as terras tradicionalmente ocupadas, notadamente sobre as terras das comunidades quilombolas, das comunidades das quebradeiras de côco babaçu e sobre as terras indígenas como se o “cerrado” consistisse num vazio demográfico e em terras abertas, disponíveis e não-ocupadas.

A APROSOJA (Associação Nacional dos Produtores de Soja) é apontada pela imprensa periódica como pretendendo incluir todo o Estado do Tocantins e 20% do Piauí nos contornos do MATOPIBA. Algumas perguntas tem demonstrado ademais a complexidade do problema: há articulações com empresas estrangeiras e com holdings ou empresas brasileiras de capital estrangeiro, visando a aquisição de terras e a implementação de projetos? Certamente que não se pode tratar as agroestratégias ou os agronegócios como produto de uma unidade de interesses. No meio empresarial há perspectivas distintas, quanto à venda de terras para estrangeiros e quanto às modalidades de gestão de terras adquiridas com recursos oriundos de fundos de pensão privados estrangeiros, e que estão em conflito aberto seja no legislativo, seja no judiciário.

Um dos resultados deste processo e desta multiplicação de tensões e disputas concerne a uma reordenação formal do mercado de terras, propiciando o ingresso na esfera de circulação de novos imóveis rurais, sobretudo aqueles vinculados à pequena produção familiar, seja no caso da titulação açodada dos projetos de assentamento (PA’s), seja no caso de uma pressão de empresas imobiliárias sobre a demanda por terras de ocupantes, também designados “posseiros”, ou ainda em situações de redução de unidades de conservação. As iniciativas ilegais de intrusamento para extração de madeira e para mineração em terras indígenas6 e quilombolas também situam-se neste quadro expansionista, ou seja, em que obras de infraestrutura e atividades mineradoras articulam-se com a expansão dos empreendimentos dos agronegócios, pressionando as terras tradicionalmente ocupadas e provocando tensões sociais e conflitos a partir da não-observância de preceitos constitucionais. Está-se diante de uma poderosa colisão de interesses, que se movimenta para assegurar a expansão dos agronegócios, mesmo reconhecendo o fracasso do modelo agrário-exportador do período colonial e o fato dos empreendimentos dos agronegócios ficarem reféns da recorrente flutuação de preços das commodities agrícolas.

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