Catuaba: Árvore que virou Comunidade

Capa de Livro: Catuaba: Árvore que virou Comunidade

Falar de gente, de povo é contar as histórias a partir de suas perspectivas. É deixar que suas vozes, gestos, corpos, ganhem a dimensão do papel transfigurado pela caneta. As narrativas que compõem este livro são traduções das tradições contadas, cantadas, sobretudo, pelos antigos moradores da comunidade.

O povoado de Catuaba pode ser classificado a partir de diferentes olhares e percepções. Resolvemos observar e deixar que a própria comunidade se descreva, se diga. A sua história mora na palavra do seu próprio povo. Compete a nós, cartografeiros, apenas, dá materialidade a dizeres.

Temos sim um proposito: queremos estudar como, nessas terras do Sertão do Brasil, se deu a presentificação e, ou, apagamento, dos povos negros e indígenas; o que há dessa memória nas narrativas da Comunidade de Catuaba. Confessamos, ainda não alcançamos essa perspectiva e, sabemos, estes espaços são lugares de silenciamentos da memória indígena e dos grupos negros que aqui chegaram e que é preciso uma cuidadosa arqueologia anti-supremacista, anti-colonialista, para fazer brotar essa memória forçosamente esquecida. Não nos angustiamos, pois, entendemos, estamos dando um primeiro passo nessa direção.

Aos poucos, vamos compreendendo a origem de Catuaba. As perguntas-guia que nos levavam aos nossos questionamentos se apresentavam a todo instante: “mas, quando começou Catuaba?”; “Quem foram às primeiras pessoas a morar em Catuaba?” Falar de Catuaba é falar de um povo onde a memória e resistência/existência perpassam os 100 anos. São séculos de permanência. O povo existente aqui descende de gerações que se misturaram e deu forma à dinâmica da comunidade. Hoje sabemos, a formação genealógica se sustenta mediante a relação de três famílias: Amaro que ficou (Morgado) Bernardo que ficou

(Silva) e os Marques conhecidos como Penteados. Fiquemos bastante atentos à história de Liquêna, que é uma das moradoras mais antigas e que tem a sua história transpassada pela construção da história da comunidade.

Com um sorriso no rosto, atenta e mostrando a solicitude em pessoa, Liquêna, aos 84 anos, compartilha os momentos de sua memória. Uma memória que é viva e vai à contramão da negação aos direitos de sua existência. Ela se refaz, se cria. Nos momentos que passávamos, ficava mais evidente que a comunidade era um espaço coletivo e a sua história também.

Além de sua história, outros personagens, igualmente importantes, deixaram suas memórias escorrerem nesse trabalho e, assim, com estas narrativas, costuramos o texto que, inicialmente, vai evidenciando a cartografia desse lugar.

As histórias aqui trazidas foram realizadas através dos sujeitos que participam da comunidade. Dentro de tantos motivos, escolhemos pontuar os seus nomes pelos nomes que são conhecidos, pelos nomes que são acordados e legitimados pelos falantes. Buscamos através destes depoimentos evidenciar que a comunidade mantém uma memória viva, pulsante em uma dinâmica particular. Observamos, também, a urgência para que essa memória seja sistematizada, sob-risco de que parte significativa dessa história caia no esquecimento.

Nas próximas páginas apresentaremos uma construção coletiva de diferentes histórias, mas que passeia por caminhos semelhantes e com um objetivo: falar sobre Catuaba. Uma história que é interpelada por Danilo, Gisele, Juracy, Robson e tantos outros pesquisadores que ajudaram a sistematizar essas narrativas. É nesse sentido que agradecemos a todos pelo ato de permitir que entrássemos em suas casas, em suas histórias, nas suas vidas. De modo particular, a todos aqueles que nos receberam e que relataram sobre os seus espaços, suas vivências, sobre suas memórias.

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